terça-feira, 18 de setembro de 2007

A morte declarada do CD ?!

“Estamos em plena atividade para reinventar nosso negócio”. A frase, proferida por Marcelo Castelo Branco, presidente da gravadora EMI no Brasil, em entrevista ao portal “Último Segundo”, pode parecer um tanto fleumática quando você considera que ela está saindo da boca do principal executivo de uma major, uma multinacional que, assim como suas co-irmãs, teve que encarar uma retração de 15% do mercado de vendas de CDs nos EUA no primeiro semestre deste ano. Na Inglaterra, os números chegam a 20%, enquanto na França batem na marca de 25%. Para você ter uma idéia, caro leitor, 2006 foi considerado o pior ano para a indústria fonográfica em plena Terra do Tio Sam… Desde 1990!

Com o perdão da comparação exagerada, mas neste contexto o simpático Castelo Branco soa como alguém na janela de um prédio em chamas que, mesmo com a aproximação do fogo, insiste em dizer “está tudo bem, estamos todos tranqüilos, não há nada com o que se preocupar”. O incêndio deveria ter sido apagado quando ainda era apenas uma brasa. Ou melhor: o fogo deveria ter sido usado em proveito próprio, para queimar em seu favor. Agora, não basta às gravadoras de grande porte “reinventarem” seu negócio. Elas precisam recomeçá-lo. E do zero.
O fato é que as grandes gravadoras mantiveram o seu velho modelo por tempo demais, motivadas por um mantra teimoso e irritante de que, para se fazer dinheiro com música, é necessário vender CDs. E esta seria sua única fonte de renda: aumentar a discografia de seus principais nomes.

Perguntem ao Gene Simmons, do Kiss, que ele ensina direitinho como a máquina funciona – artista ganha dinheiro de verdade fazendo shows e vendendo toneladas de merchandising, badulaques que vão das tradicionais camisetas aos buttons, bonequinhos, bonés e demais bobagens com B que você possa imaginar.

E olha que o roqueiro da cara pintada já sabia disso na década de 70, antes mesmo de existir a internet! Querem outra aula? Falem com a Joelma e com o Chimbinha, do Calypso. Ué, tá rindo do quê? Eles vendem horrores e comandam inteiramente o seu próprio negócio, do início ao fim do processo, sem a participação de gravadoras ou quaisquer outros atravessadores. Isso porque eles conhecem exatamente o seu público e o mercado ao qual se destinam, atirando com as armas certas no alvo certo. Bang!

Onde está o erro, você pode perguntar? Eu tenho muitas apostas. Um deles foi acreditar, assim que o Napster começou a mostrar as garras, que a internet era uma ferramenta demoníaca, capaz de arrepiar os últimos fios de cabelo do baterista do Metallica – ao invés de usar seu potencial de disseminação a favor dos artistas e dos selos, agregando um valor de modernidade às suas marcas. Outro erro gritante foi continuar acreditando que a mídia, representada principalmente pelas rádios (e seus jabás, aquela coisa que todo mundo sabe que existe mas ninguém admite), continua sendo capaz de forjar um músico como outrora conseguia – quando todos nós sabemos bem que a relação do ouvinte com a música mudou, e cada um obtém suas faixas favoritas do modo que bem entende, ouvindo rádios customizadas como a LastFM. A Lily Allen ficou famosa graças ao MySpace, meu povo, muito antes de sequer lançar um CD oficial! Quanto você acha que ela gastou em divulgação? Qual foi o plano de marketing da menina?

Então foi a pirataria que matou o CD (se é que a gente pode dizer que ele morreu verdadeiramente)? Digamos que esta é uma visão simplista demais da coisa toda, não é mesmo? Também em entrevista ao “Último Segundo”, o inteligentíssimo João Marcello Bôscoli, presidente da Trama, resume a coisa muito melhor do que eu poderia.

"O CD foi destruído por uma série de políticas e procedimentos errados. Preço errado, trabalho de ponto de venda feito errado, design tratado como se fosse supérfluo, etc. A internet foi tratada como criminosa, os piratas deram aulas de logística e preço, o DRM (sistema anticópias adotado pela indústria de disco) é visto como uma solução. Foi inevitável que as pessoas perdessem o interesse na mídia”. Acho que deu para sacar, hein?

Um mês depois de seu aniversário de 25 anos, o CD ganha versão econômica, com quantidade menor de faixas, uma capa de papelão e um precinho mais acessível ao consumidor final. Outra estratégia são os downloads pagos (incluindo aqueles que remuneram o artista a cada canção baixada), os downloads promocionais (compre um biscoito, digite o código de barras e baixe uma faixa exclusiva) e até mesmo os downloads integrais de discos de catálogo. Tá valendo de tudo para recuperar o tempo perdido.

E ainda dá tempo de recuperar o fôlego? Dá, claro que sim. Desde que os executivos entendam o que os artistas independentes já entenderam muito antes: a música é um negócio muito mais amplo do que a própria música, assim como os filmes em si são apenas uma parte do enorme potencial de negócios que a indústria do cinema permite. Eu, por exemplo, tenho lá a minha porção de MP3, coisa e tal. Mas não compro produtos piratas. E jamais deixei de comprar CDs. Se eu gosto do músico/banda de fato, se aquele CD me agradou mesmo, se eu sou fã de verdade daquele material, vou lá e compro. Porque sou aquele tipo que pode ser chamado de colecionador. Que gosta de ter o CD, o DVD, o gibi, o livro em mãos, para quem as versões virtuais não têm a mesma graça do que as versões do mundo real. Se eu existo, muitos outros como eu devem existir. Nós só precisamos ser estimulados de verdade.

Assim como os artistas entenderam que eles têm que ser cada vez melhores num mercado com tantas possibilidades como as de hoje, em tempos de iPod e similares, é hora das gravadoras entenderem que elas precisam evoluir de fato, e não ficar aplicando às velhas formuletas aos novos veículos. Sinceramente: downloads pagos de MP3 não são apenas uma versão virtual das prateleiras cheias de discos de um grande magazine? A internet não permitiria uma estratégia muito mais ousada, agressiva e funcional? Como diria Pasquale Cipro Neto: é isso.

Um comentário :

  1. Concordo em Gênero, Nº e Grau, tbm sou colecionador e minha atitude é igual a sua , qdo gosto vou lá e compro (mas que os preços dos CD's são abusivos isso são mesmo)e a internet c/ certeza é um excelente meio de divulgação, pois nos 2 últimos anos conheci muita coisa que eu nem sabia que existia e olha que faz muuuuuitos anos que sou "garimpeiro musical", Valeu!!
    parabéns pelo post e pelo Blog que só conheci hoje.
    Abraços

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